sábado, 17 de novembro de 2012

A sensitiva.



  Ela tinha medo de espíritos. Tinha sempre a sensação de estar sendo vigiada, seguida, como se, a qualquer momento, pudesse ser atacada. Sua família tinha um grande histórico de sensitivos, e já havia visto sua avó conversando com seu finado avô.

  Mas ela, ah, ela não conversava. O medo sempre fora maior que a vontade de um entendimento. E quando saía de casa, tudo piorava: sentia milhares de olhos sobre ela, como se uma espécie bizarra de holofote atraísse todos aqueles olhares sem olhos e carícias etéreas.

  Certo dia, o medo venceu. Nossa pobre garota estava ali, encolhida ao portão da sua casa, chorando copiosamente. Foi quando a mão amiga de um senhor, seu vizinho de longa data, tocou em seu ombro. Era um homem de 60 anos, com um rosto rosado e óculos redondos. Estava um pouco acima do peso, e caminhava de uma forma engraçada. Ofereceu sua mão amiga, abriu a porta de sua casa e ofereceu um chá, para acalmar o ânimo, e ela dormiu em seguida.

  Acordou em uma fria maca. Mas, o que havia acontecido? Era algo no chá? Ela estava em um pesadelo? Ou havia acordado de um? Difícil saber, até que o bom senhor aparece na sala, com um avental e máscara e, sem ao menos dizer uma palavra, começa a serrar o pé da garota. Em meio aos delírios que a dor das múltiplas mutilações traziam, ela imaginara se era realmente por espíritos que se sentia desejada e vigiada. Enquanto isso, percebia inúmeras presenças assistindo a cena, com seus olhares de órbitas vazias.

   Nos minutos finais em que sentia sua vida se esvaindo, ela imaginou se iria se juntar aos espíritos que passou  o tempo todo temendo, e aprendeu que devia ter medo da insanidade e maldade dos vivos, ao invés do frio na espinha trazido pelos mortos.